Psicodrama Organizacional na solução de conflitos.

Publicado na revista Ser Mais (SP) com o título Psicodrama Organizacional – como resolver os conflitos que podem prejudicar as relações e os resultados das empresas e dos indivíduos.

Márcia sempre ouve compreensivamente os líderes que a procuram no RH em busca de suas orientações assertivas sobre condutas a tomar nas relações com subordinados, pares e superiores. No entanto, aquele gerente diante dela falava de suas frustrações na lida com um dos diretores com quem a Gerente de RH também mantinha desafetos mal resolvidos. Todo esforço consciente da sua maturidade profissional e as polidas argumentações não foram suficientes para mascarar sutis e incontroláveis expressões de apoio ao conflito – as emoções mais profundas de Márcia expulsavam gotículas de seu desejo primitivo de vingança.

Na mesma empresa, em outro momento, Carla se sentiu frustrada com o parecer que Sônia lhe deu sobre seu relatório: “Achei confuso, sem muito nexo” – argumentou Sônia, 55 anos, Assessora Jurídica com bom tempo de experiência no mundo corporativo. Aquele documento foi gerado num dos momentos de mais inspiração e disposição de Carla, que contava com a validação da colega antes que fosse lido na reunião. Mas Sônia, sutil e inconscientemente, transferira para aquela oportunidade a mágoa de não ter sido ela a escolhida para escrevê-lo.

Em ambos os exemplos, dois aspectos parecem comuns. Analisando-se do ponto de vista profissional as duas personagens fictícias, Márcia, Gerente de RH, e Sônia, Assessora Jurídica, são maduras e experientes – transmitem admiração e assertividade ao ponto de serem ambas consultadas por colegas em assuntos bastante significativos. Por uma abordagem pessoal e por uma espiadela nos comportamentos de aparência adolescente, intuem-se os seguintes diagnósticos para ambas: (1) as duas representam seres humanos normais e como tal, entes complexos, ambivalentes e multifacetados; e, o mais perigoso, (2) as duas estão em estado de conflito latente nas relações corporativas.

As pessoas têm habilidade intrínseca para justificarem verbalmente, até para si próprias, as razões óbvias de suas ações sem notarem os estímulos vindos discretamente das vísceras. Numa organização, quanto mais significativos forem os papéis e poderosas as pessoas, mais potente e abrangente será a influência dessas subjetividades no chamado clima organizacional. Este, por sua vez, estimulará os mesmos indivíduos a seguirem movimentos do todo, numa unidade que o Psiquiatra Jacob Levy Moreno, pai do Psicodrama[i], chamou de estado co-inconsciente.

Peter Drucker escreveu que não identificou inovações significativas no campo das motivações do trabalho desde 1928 quando os testes de Elton Mayo as originaram em Hawthorne. Da mesma forma, eu, humildemente, em vinte anos não estudei ou experimentei nada sobre relacionamento humano que não tivesse algum fundamento ou explicação na ciência centenária de Moreno, nem mesmo a produtividade de sua aplicação.

A condução de seções psicodramáticas por profissional Psicodramatista – o diretor – apoiado por métodos e técnicas como duplo, espelho, átomo social, inversão de papéis, concretização, solilóquio etc. traz razoável espontaneidade à tona. Os vínculos saudáveis de indivíduos influenciando e sendo influenciados pela tele dependerá da espontaneidade com que se interagem essas pessoas. O ser espontâneo, para Moreno, estará atrás dos papéis interpretados no dia-a-dia, estará nos domínios conscientes do próprio autor.

A começar pelas lideranças, será preciso que cada membro das equipes se reveja nas suas ações, se olhe honesta e corajosamente no espelho, inverta seus papéis e observe-se por outro olhar; concretize e encare alguns entraves emocionais; comente em solilóquio para si os próprios comportamentos e motivações; permita-se refletir em dupla suas atitudes. Em momentos assim as pessoas crescem, amadurecem. Depois, ajudam a fazer crescerem os pares, subordinados e superiores, e geram relações e ambiência de confiança – terreno fértil para a produtividade.

[i] O Psicodrama – O termo Psicodrama se origina do grego, a partir de “psique” – alma, eu – e “drama” – ação. Eu na ação. Da filosofia às técnicas e métodos, passando pelo desenvolvimento da própria ciência, Jacob Moreno analisou, estruturou e disponibilizou instrumentos para descobertas interiores e evolução das relações intrapessoais e interpessoais, através principalmente da ação dramática. Desde então, estudiosos e profissionais psicodramatistas, sempre fiéis às origens científicas morenianas, adequam a utilização de tais ferramentas às novas formas do funcionamento social humano. Ao mesmo tempo, os desafios relacionais das pessoas, desde a Revolução Industrial, vêm se agravando em velocidade vertiginosa especialmente nas densas dinâmicas de trabalho. Consequentemente, surge nas organizações um produtivo laboratório para o crescimento dos profissionais enquanto pessoas e suas equipes e, para isso, o Psicodrama Organizacional.

Sobre Álvaro de Carvalho Neto

Educador coorporativo desde 1996, tem graduação em Administração de Empresas e especialidades em Análise de Sistemas, Marketing, Liderança, OS&M, Gestão de Projetos, Coordenação de Grupos, Coaching e Psicodrama Sócio-educativo.

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