A saga empreendedora de Frieda: o começo.

Quando as necessidades do negócio vencem o estilo pessoal de empreender. Revisão do texto publicado no Jornal Local em 13/04/2022, com o título “A paz nos negócios se conquista pela luta”.

Nascida em uma pequena cidade de imigrantes alemães, a então adolescente Frieda acompanhou sua família na mudança do interior paranaense para o cerrado mato-grossense. A aventura e o destino foram propostos pelo tio, que já tocava uma bem sucedida oficina de tratores onde o irmão pode se empregar quando também chegou com a família à localidade. Ali, Frieda frequentou a escola até o ponto que sentiu lhe ser útil para o trabalho daqueles dias.

Num pequeno restaurante aberto para complementar a renda da família, Frieda ajudava à mãe, negociando, comprando, transportando, abatendo e descarnando porcos. Dominava também os segredos para recortar as peças de carne que compunham o eisbein, o goulash, as almôndegas, picados e demais pratos alemães servidos aos clientes. Nos momentos de folga, lá estava a moça enfiada num macacão de brim encardido, carpindo e varrendo o terreno ao redor da casa e gritando tarefas prontamente cumpridas pelos irmãos.

Contrariando o significado de seu nome, a paz incomodava à Frieda. Boa parte dessa característica da moça, vinha herdada da mãe e foi o que a impulsionou mais tarde na decisão de abrir seu próprio negócio: um pequeno supermercado no centro da cidade.

“Comigo o problema é resolvido na hora, não espero, eu ajo” – a expressão favorita da empresária de meia idade, esguia, bonita e determinada ainda me vem à mente. A combinação da convicção com a sensualidade lhe potencializava vantagens de barganha, abrindo as defesas dos mais espertos negociadores. Era preciso muita concentração para manter a plenitude de meu empenho nos aspectos que a atrapalhavam na conduta produtiva que sempre teve.

Dentre as virtudes pessoais que a levaram àquele ponto dos sucessos, Frieda se incomodava agora com um gatilho que se disparava nela antes que a consciência pudesse detê-lo. Algo que a impulsionava inconscientemente a, por exemplo, assumir a tarefa quando notava alguma lentidão na execução por outra pessoa. Nenhuma das consequências desse comportamento era mais significativa para a empreendedora que o arrependimento e a culpa que sentia depois.

Algo que a impulsionava inconscientemente a, por exemplo, assumir a tarefa quando notava alguma lentidão na execução por outra pessoa.

“Não gosto mais da minha reação nesta fase da vida. Às vezes, acho que existem duas Friedas, uma que faz como sempre fez, reagindo sem pensar, e outra que odeia o que a outra faz” – reclamou. “Não resisto à oportunidade de dar uma lição no funcionário que demora pra fazer alguma coisa. Eu vou e faço, pra ele ver que deveria ser mais rápido. Depois, a outra Frieda me aponta a baita oportunidade que eu perdi de deixar as pessoas mais autoconfiantes, como eu sou. Minhas reações são automáticas e iguaizinhas às que minha mãe tinha comigo. Ao invés de ajudar no crescimento da minha equipe, eu aniquilo essa possibilidade com intervenções impensadas. Muitos vão embora e ficam apenas os mais acomodados, que não estão preocupados em aprender, mas satisfeitos em fazer o que eu mando. Isso não me interessa mais”.

Estávamos ali, ela e eu, para darmos corpo formal ao empreendimento, deixando-o pronto para crescer além dos limites que apenas Frieda e seus impulsos alcançavam. Para isso, era necessário um desejo forte e verdadeiro. Parecia que o incômodo que lhe causava o próprio comportamento, a colocaria no compromisso consigo mesma de mudar. Era com o que contávamos naquela tarefa. Sem isso, todas as tentativas seriam abandonadas atrás de algum atropelo muito fortemente justificado com necessidades de curtíssimo prazo.

Frieda não mudou, mas aceitou uma nova tática. Contratamos um gerente com qualificação, perfil competitivo, adequado à cultura já dominante e acostumado à gestão sobre bases institucionalizadas. O negócio de Frieda ganhou identidade própria e assimilou a forma rápida de satisfazer clientes, trazida pela fundadora. Mas, agora, sem a necessidade dos impulsos pessoais que o fizeram existir.

Sobre Álvaro de Carvalho Neto

Educador coorporativo desde 1996, tem graduação em Administração de Empresas e especialidades em Análise de Sistemas, Marketing, Liderança, OS&M, Gestão de Projetos, Coordenação de Grupos, Coaching e Psicodrama Sócio-educativo.

1 comentário

  1. Texto que faz com que a gente reflita de forma prática nossas atitudes, tentando encontrar um caminho, equilíbrio, bem interessante, a questão de se encontrar com quem é um tanto lento, eu tbm não deixava a pessoa terminar a tarefa, mas um dia decidi não interferir e a pessoa hj é mais rápida que eu kkk e gerência uma loja, fico feliz por ter mudado.

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